segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Ensaio sobre a paixão


Acho que quando gostamos muito de alguém, acabamos por gostar mais do Mundo, em geral. É como se aquela pessoa, só por existir, conseguisse acabar com todas as guerras, toda a fome, a sede, as epidemias, a poluição... Como se as estrelas fossem mais sorridentes para o Planeta Azul, e o fim, estivesse escondido num buraco negro.
E, no entanto, os sentimentos evoluem tão devagar como as nuvens percorrem os céus...
Quando sentimos o seu perfume pela primeira vez, é apenas um bom perfume. Cheira bem e sabe bem estar perto daquela pessoa porque é agradável, o ambiente. À medida que nos vamos conhecendo melhor, vamos começando a apreciar mais e mais a sua companhia, o seu cheiro, o ambiente que ele cria - como o incenso, é capaz de dar uma espécie de paz de espírito, ou criar um tomulto dento de nós.
A sua face, ao início é apenas uma, no meio de tantas, tantas outras. Se, por acaso nos cruzassemos na rua, provavelmente nem nos iriamos conhecer, mesmo depois do primeiro confronto. Porque é o início, não há ligação, não há ambiente. E, no entanto, à medida que o tempo passa, vamos dando por nós a começar a reparar em alguns pormenores interessante - os seus olhos são cor de mel, misturada com o verde das folhas dos plátanos; quando sorri, forma uma covinha de cada lado da cara e os seus dentes são perfeitos, tão perfeitos na sua tamanha imperfeição que chegam a fazer-nos sorrir; e a sua expressão quando está irritado, quase que muda de cor, quase que muda de cara, quase que envelhece. E, ainda assim, começa a haver qualquer coisa nele que nos dá a impressão que em uma face digna de tecto da capela sistina: perfeita, na sua tamanha imperfeição - pormenores esses que nos fazem sonhar, e relembrar a sua cara.
E o seu toque... O primeiro toque, um aperto de mão, um bater de ombros seguido por um ''peço desculpa'', o primeiro toque será, de qualquer das formas, quase imperceptível. Porém, quando a relação começa a avançar, o seu toque começa a ser um factor de nervosismo, ou felicidade, ou distração. Começamos a notar que tem a pele suave. Reparamos também que as suas mãos, as mãos que nos tocam, são perfeitas - perfeitas, na sua perfeição! - tal como as suas unhas, os seus dedos, o seu todo. O seu toque, deixa de ser apenas um toque comum, para passar a ser aquele pelo qual mais ansiamos.
Começamos a conseguir distinguir o seu cheiro no meio de uma multidão perfumada, a dezenas de metros. A sua face passa a viver connosco, sonhar connosco, ser quase um espelho daquilo que nós somos - ou não será o contrário? - e, quando menos esperamos, queremos que ela fique connosco eternamente, ainda que seja só no sonho e mesmo que este seja sonhado acordado.
O seu toque, deixa de ser uma casualidade e passa a ser uma necessidade. E quando, num dia, por qualquer motivo, ele não nos toca, parece que o Mundo fica feio, outra vez.
Quando, por qualquer motivo, ele muda de perfume, sentimos saudades daquele que nos invadia a alma e nos aquecia o coração, e o Mundo fica feio outra vez.
E a sua face, se por acaso percebermos que é apenas fruto dos bons genes que ele teve a sorte de conseguir, torna-se estranha e deixa de corresponder àquela cara maravilhosa, àquela cara de anjo que invadia as nossas noites e nos abraçava os pensamentos e o Mundo fica feio outra vez.
Porque é isso que significa estar apaixonado: cheirar, ver, sentir, gostar e, há medida que o tempo passa começar a ver que a perfeição não está lá e o Mundo é o mesmo.

A não ser que tenhamos encontrado a nossa alma gémea. Mas... Que sei eu, Ninna Jules, acerca disso? Neste momento, sou apenas uma marioneta em forma de B. Um B gigante que paira pelos meus sentidos, me sussura ao ouvido e me diz que me pode amar.
E, para já, quero cheirar mais, ver mais, sentir mais e gostar mais deste que me transformou numa marioneta em forma de B. O Mundo, ainda é belo. E eu gosto bem dele assim.

1 comentário:

A tua opinião conta, e eu conto com ela,

Ninna (: